Em Lisboa já se sabe
o Tejo é lume
que ilumina a madrugada
dos amores
a Sé ergue até ao Céu
vício e ciúme
e a Ribeira é o castelo
dos sabores
Em Lisboa já se sabe
há uma ponte
que são duas avistando
um cacilheiro
a singrar por entre as ondas
do cansaço
de quem vem já atrasado
do Barreiro
Em Lisboa já se sabe
há sempre um gato
que apregoa p’los
telhados
o Janeiro
e uma boca a segredar
que veio nua
à varanda a vizinha
do primeiro
Em Lisboa já se sabe
vive um puto
a fintar o mundo inteiro
p’las esquinas
e azulejos onde moram
sorridentes
São Vicente Santo António
e as varinas
Em Lisboa já se sabe
há mil gaivotas
e mil pombos mil pardais
mil andorinhas,
que num golpe d’asa
varrem
mil derrotas
para dentro do braseiro
das sardinhas
Em Lisboa já se sabe
a lua paira
por detrás do reposteiro
do horizonte
sobre o carreiro furtivo
de quem vai
a esgueirar-se p’la viela
ali defronte
Em Lisboa já se sabe
cada rua
é um novelo de passos
de ninguém
e nas fendas da calçada
nascem flores
que por vezes nos dão
ares
de ser alguém
Em Lisboa já se sabe
há um poeta
a beber pelos cafés
a sua sombra
e o fantasma do futuro
que nos cerca
com a vela de um navio
que nos assombra
Em Lisboa já se sabe
há uma voz
que a guitarra não
permite
sossegar
a lembrar o que será
de todos nós
na cidade que ainda está
por inventar
E tudo o mais que há
sem nunca haver
todo o mal e todo o bem
e o que não cabe
mas nos cabe no viver
e no morrer
há e cabe em Lisboa
já se sabe
Sem comentários:
Enviar um comentário