domingo, 31 de maio de 2020

Canção adolescente



Para o Luís Pedro Fonseca,
pelo que, em todos nós, a adolescência é perene.


Hoje, deixa-me ficar
Aqui, no quarto, sozinho.
Baixa o estore devagarinho,
Fecha a porta de mansinho
E, a quem te perguntar
Onde eu estou ou possa estar,
Diz que me pus a caminho.

Que fui em busca de mim,
Não sei se longe se perto,
Se no mar se no deserto,
Se a sonhar ou se desperto,
Se no princípio se ao fim
De quem sou ou ao que vim,
No que é seguro ou no incerto.

Que não sabes como o faço,
Se com prazer se com dor,
Com preguiça ou com suor,
Calmamente ou com ardor,
Se progrido a cada passo
Ou se é à força de braço
Que abro mundo em meu redor.

Que, ao regressar, porventura,
Depois de cumprido ou feito,
Traído ou, até, desfeito
Aquilo a que me respeito,
Não trarei nem amargura
Nem tristeza, só ternura
P’la vida a bater no peito.

Mas se, ao voltares da rua,
Me encontrares ainda aqui,
Descobrirás que o que vi,
Quis, soube, amei, pressenti,
Foi o que uma praia nua,
Entre o horizonte e a lua,
Sussurrava sobre ti.
2012

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